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EU NÃO ACHO GRAÇA


Mesmo quem gosta de mim (reconheço que são poucos) não consegue negar que sou um chato, porque quando todo mundo sonha em comprar um livro que vendeu milhões de exemplares ou assistir a um filme consagrado pelo público e pela crítica especializada, eu olho com desconfiança.

Claro que o problema é comigo, sempre, mas não resisto a ideia de que toda essa confusão política nascida de uma derrota eleitoral que não merece um reconhecimento público claro e honesto, de uma débil e pouco convincente condenação à crimes contra o direito de ir e vir, antecedida de justificativas ridículas de que são justos, seguido de ordens secretas sob sua autorização ou tolerância, disparadas por grupos de rede social para ignorar o discurso e continuar cometendo-os, me preocupa, e muito.

Ver pessoas presumivelmente inteligentes chorando, ajoelhadas, rezando por um cidadão claramente desonesto, mentiroso e cultuador de mitos em seu benefício, festejando uma notícia ridícula e improvável de prisão de um ministro do TSE, me assusta.

Ir para as ruas de cara limpa pedir a instauração de uma democracia nascida de golpe militar, mantendo pela força das armas o governo derrotado, é fantasticamente preocupante. Olho as fotos dos protestos e reconheço alguns amigos queridos, e choro.

Até que eu vejo um filme em que alguns cantam o hino nacional e outros levantam o braço em saudação nazista! Daí, eu me apavoro.

Não estou defendendo o vencedor, pois esse, com a roubalheira que promoveu ou permitiu, criou o monstro e tem tanta ou mais culpa que seu adversário do estado de coisas absurdas que vivemos.

Quem já leu alguma coisa sobre a criação e o crescimento do partido nazista alemão sabe que, no início, a sociedade ria deles, de suas roupas e seus ritos ultrapassados, mas em algum momento eles conquistaram mais e trinta por cento dos votos e seu chefe virou chanceler. O resto, bem, o resto foi o maior crime contra a humanidade que a história já registrou.

O nacionalismo exacerbado, o culto doentio à bandeira, a proteção extrema e desnecessária à família (que a nós cidadão cabe defender, não ao Estado), a condenação às orientações sexuais de alguns, o desprezo à ciência moderna, não parecem familiares?

Ser patriota não é deixar de pensar e aceitar o desprezo à vida, o desrespeito aos contrários, a perseguição aos negros, aos pobres, aos deficientes (sob a canalha e distorcida interpretação da teoria da evolução de Darwin), o culto ao desenvolvimento econômico à custa do meio ambiente, a semeadura do ódio entre irmãos, parentes e amigos, que se transformam em agentes do Estado e do ditador de plantão.

Eu amo a nossa bandeira, e por isso mesmo não aceito que um partido dela se aproprie a ponto de nos fazer ficar envergonhados em vestir uma camiseta amarela e com medo de vestir outra vermelha (do nosso time!).

Adede, estás exagerando! Tomara, mas duvido. Quando meus medos se confirmarem, espero estar morto. Não acho graça nenhuma em aceitar a democracia quando convém e destruí-la quando perde o jogo democrático cujas regras conhecia previamente.

Vai rindo.

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João Marcos Adede y Castro

JOÃO MARCOS ADEDE Y CASTRO é graduado em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria, sendo Mestre em Integração Latino Americana, pela mesma Universidade.

 

É doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, pela Universidade del Museo Social Argentino, e doutorando em Direito Civil pela Universidade de Buenos Aires, ambas de Buenos Aires.  

 

Foi Promotor de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul por quase 30  anos, tendo exercido as atribuições de Promotor de Justiça Especializada de Defesa Comunitária, com atuação preponderante nas áreas de defesa do meio ambiente, interesses sociais e coletivos e improbidade administrativa. É Professor Universitário.

 

 É membro e  foi Presidente da Academia Santa-Mariense de Letras, ocupando a cadeira número 16, cujo patrono é o escritor e jurista  Darcy Azambuja. É advogado em Santa Maria, RS.

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